VIRANDO A MESA DO PODER | BALANÇO MANDATO 2021

Dandara Tonantzin
15 min readDec 23, 2021

Quando se ganha uma eleição, se inicia uma jornada para movimentar todos os sonhos, compromissos e lutas que foram discutidas e firmadas. Nosso projeto político, desde que foi concebido, tem um comprometimento com as causas coletivas, com as resistências populares e com a justiça social.

Nossa jornada pelas ruas e redes nas Eleições Municipais de 2020 teve como princípio não propor mais do mesmo, fazer propostas para os problemas reais, dialogar com os 99% da população, projetar a Uberlândia que queremos e começar desde já a construí-la, com as nossas próprias mãos. Mãos de classe trabalhadora, mãos de mulheres, negras e negros, jovens, mãos que não se cansam, cuidam e desafiam.

Entramos nessa com a gana e a coragem de transformar as estruturas políticas que viraram ruínas — no ano anterior a nossa eleição, a Casa Legislativa a qual presto serviços ao povo, havia presenciado um escândalo de corrupção em que 23 vereadores foram cassados. E isso soou como um “basta” nos endereços que costuram a cidade de Uberlândia; havia na população uma vontade de que as coisas renovassem e fossem diferentes do que foi datado como “normal”. E esse sentimento elegeu como a mais votada da cidade, uma mulher negra, jovem e periférica, compromissada com a democracia, com a igualdade de direitos, com as diversidades e com a voz do povo. Um voto de confiança dado por 5.237 pessoas!

Violência política de gênero e racial: uma constante!

Nosso mandato se dispôs, desde janeiro, a ser uma trincheira de luta, fazer oposição aos atuais governos, construir junto aos movimentos sociais e a maioria do povo, políticas que se movessem do disfuncional para o funcional. Não é uma tarefa fácil ser mulher, negra e jovem em uma Casa acostumada a uma política de oligarquias, e por isso fui, durante muitos expedientes, deslegitimada com falas do tipo: “tá chegando agora, vai devagar”; “é muito jovem”, “é só um fenômeno”, como se essas frases recheadas de receio pelas minhas construções, justificassem as interrupções, interdições, gritos e boicotes destinados a mim.

Os questionamentos também são de ordem política, sinto que não importa o quanto o nosso Gabinete trabalhe, para muitos ainda vai ser pouco, vai estar aquém do que esperam. Durante um ano de mandato só descansei um único feriado em abril. Não teve dia, hora e nem lugar. Nossa vontade nos movimenta e não é fácil perceber que homens brancos, até mesmo do meu partido, que me antecederam, não passaram por um décimo do que tenho passado.

Sem contar os inúmeros casos de racismo. Sinto como se a dita “casa do povo” não tolerasse a presença da maioria do povo. Aqueles que se sentem herdeiros da casa grande, donos do poder, repudiam a nossa presença. A violência política, de gênero e racial foi uma constante. Desde os seguranças me perguntarem “qual Gabinete você vai?”, ataques racistas durante uma audiência pública com o comentário “#foraturbante”, até comentários em perfis bolsonaristas que me chamaram de “encardida” e “neguinha”.

Ter que lidar com tanto ódio, violência e ataques não é uma tarefa fácil. Estou na política há 10 anos, já fui militante, assessora, dirigente, conselheira, mas nada se compara com as violências que passei esse ano.

Chegamos mostrando a que viemos

Nosso projeto político chegou propondo à Casa Legislativa uma reforma administrativa que auxiliasse nas reformas estruturais para que o funcionamento fosse mais efetivo e incluísse a participação popular. Uma vez que, a Câmara Municipal de Uberlândia ainda é ineficiente e pouco útil à vida do povo.

A população tem a impressão de que a Câmara não serve pra nada, e que vereadoras e vereadores, ou não trabalham, ou trabalham pouco. Todas as funções na Casa Legislativa são mal desempenhadas. A fiscalização, por exemplo, é realizada através de ferramentas frágeis e ineficazes e a representação, que deveria ser o papel exercido por vereadores eleitos, é unilateral, ou seja, não existe de fato.

O Portal da Transparência, que deveria exercer um papel funcional na fiscalização do nosso trabalho, tem informações confusas e inacessíveis, porque a linguagem utilizada pelo Poder Legislativo é pouco didática para o entendimento do povo.

No nosso Gabinete prezamos por um modelo de organização que não se move pelo espontaneísmo, nós planejamos, avaliamos, debatemos semanalmente. Em plenárias digitais abertas, que aconteceram uma vez por mês, construímos espaços para debater política, pensar nossa atuação na Câmara, tirar posições ou iniciativas.

Dessa forma, além do papel de vereadora, também estou na composição de três Comissões, sendo elas a Comissão Mista de Participação Popular e a Comissão de Igualdade Racial, das quais sou presidenta e a Comissão de Educação, na qual sou membra. Nas comissões que presido, temos um plano que conta com diagnóstico e ação, buscando ter os ouvidos atentos aos problemas relatados pela sociedade para, a partir dessa escuta, elaborar ações que sejam efetivas para os problemas.

No começo do ano havia na cidade de Uberlândia uma pressão para que as aulas presenciais voltassem, mesmo com a alta nos números de COVID-19 e o caos na saúde da cidade. Articulamos, junto a população, atos que barraram o absurdo e o negacionismo, exigindo vacina e uma maior responsabilidade do Poder Executivo do Município sobre a vida da população uberlandense.

Inclusive, em janeiro, os números nos casos de COVID-19 voltaram a aumentar, resultando num colapso no Triângulo Mineiro que se estendeu por alguns meses. Em fevereiro, quando Uberlândia registrou mais mortes por COVID-19 do que todo o mês de janeiro, articulamos junto ao Governo do Espírito Santo (ES), a transferência de pacientes de para leitos de UTI do ES e 22 ventiladores pulmonares emprestados para auxiliar no combate a pandemia no momento em que o Sistema de Saúde Municipal enfrentou sua maior crise. Essa articulação dependia também da boa vontade do Poder Executivo para ser efetivada, o que não aconteceu. A Prefeitura de Uberlândia virou as costas à nossa prestação de serviços, enquanto receitava cloroquina e ivermectina a rodo em todas as unidades de saúde.

Isso demonstra, de uma forma cruel, como a oposição é vista dentro do cenário político da cidade, uma vez que o trabalho que propomos, os projetos de leis que elaboramos, as articulações políticas que fazemos para o bem-estar social são negligenciadas pela base e pelo governo para nos barrar e boicotar. Como se as nossas proposições, que são do interesse do povo, pudessem ferir um acordo maior que sustenta a “velha política”. A ordem é barrar qualquer projeto ou iniciativa que parta de nós. O que nos desafia ainda mais, uma vez que somos o único mandato de oposição na Câmara e a cada votação precisamos fazer diversas articulações, para não ficarmos isolados.

Em março, com a potência da luta das mulheres, elaboramos uma série de projetos de lei da pauta feminista. Inicialmente, protocolamos o PL 055/2021 (Processo 103/2021) que propõe a Política Municipal de Dignidade Menstrual para adolescentes e pessoas que fazem uso do absorvente e passam por situação de vulnerabilidade social. O projeto que ainda segue em trâmite na Câmara, recebeu vários pareceres contrários e por diversos momentos ficou sem andamento.

Desde a campanha, a luta por dignidade menstrual é um dos temas abordados por mim e pela minha equipe, sendo esse tema hoje, após a repercussão nacional com matéria exibida pelo Fantástico, ainda mais urgente e necessário de ser posto na mesa, debatido, conversado e executado . Infelizmente, o projeto de lei segue parado por falta de vontade política, mas devo considerar uma vitória a inserção do assunto nas políticas do município, uma vez que a Prefeitura de Uberlândia se apropriou da pauta e regulamentou a distribuição de absorventes nas Escolas do Município, mas ainda é uma luta do nosso gabinete fazer com que a Dignidade Menstrual seja garantida por lei. Continuamos em campanha de arrecadação e distribuição de absorventes.

Protocolamos ainda o PL 104/2021 que dispõe sobre a abertura de cotas de até 5% do número total de vagas para a contratação de mulheres em situação de violência doméstica nas empresas que firmam contratos com a Administração Pública Municipal. Tal medida constituiria mais uma importante medida de proteção social às mulheres vítimas dessa violência, favorecendo o seu afastamento do relacionamento abusivo e, ao fim, contribuindo de forma efetiva para dar dignidade e até mesmo protegendo a vida dessas mulheres. Ocorre que, infelizmente, o projeto recebeu parecer contrário com justificativa de inconstitucionalidade.

Sem cessar a luta, continuamos com diversas articulações junto aos movimentos de mulheres e a demanda por parto humanizado, para combater a violência obstétrica, mostrou-se muito latente. Diversas mães em vários espaços que construímos relataram procedimentos desnecessários ou não autorizados durante todo o período gestacional. Assim, protocolamos o PL 132/2021 que estabelece diretrizes para a criação do programa Centro de Parto Normal e Casa de Parto, para atendimento à pessoa grávida durante período gravídico-puerperal. O PL recebeu parecer contrário, contudo por se tratar de demanda urgente e necessária, articulamos junto a Deputada Leninha (PT), R$100 mil para o HC, para o Parto Humanizado.

Já o PL 086/2021 (Processo 150/2021), que propunha ao calendário municipal o Dia Marielle Franco, contra a violência política contra Mulheres Negras, foi aprovado em primeira votação pela Câmara — com esforços, lutas e debates com os colegas vereadores. No entanto, nos bastidores, o projeto foi negociado para a vista e assim, rejeitado. O conservadorismo e o bolsonarismo, que estão presentes em vários gabinetes da Casa Legislativa, alegaram que o projeto era ideológico por constar palavras como “gênero” e “racializar o debate”, como se eu não soubesse a nomenclatura correta para essa ação.

Durante o primeiro ano de mandato, trabalhamos para o povo de Uberlândia. Em números, apresentamos 285 requerimentos, 27 projetos de lei, 8 audiências públicas, isso concomitante com as 852 agendas e ações que extrapolam a arquitetura da Câmara para ir de encontro ao povo. Porque o nosso compromisso é ouvir e ver e sentir as pessoas que constituem a cara dessa cidade e o que vimos, nas nossas andanças, não é o que desejamos à sociedade.

O desgoverno de Bolsonaro aprofundou uma crise sanitária que se desdobrou em econômica e social. Em Uberlândia, até dezembro de 2021, mais de 3.100 pessoas faleceram em decorrência da COVID-19. A fome e o desemprego estão escancarados, na quantidade de pedidos que chegam ao nosso gabinete por cesta básica. Enquanto defensoras de políticas públicas voltadas à promoção de direitos e a igualdade, propomos, através do PL 103/2021 (Processo 174/2021), a Renda Básica Emergencial. Fizemos tudo que pudemos: panfletagem, audiência pública com o mestre Suplicy, articulações com os vereadores/as, plano de impacto orçamentário, indicativos ao prefeito, debate no política cruzada, carro de som pela cidade, articulações com partidos e movimentos sociais.

O projeto, arquivado, por sinal, garantia a pessoas vivendo em situação de vulnerabilidade social, uma quantia em dinheiro para dar conta de despesas mínimas, para não fazer da fome uma realidade e para não maximizar a desigualdade social que queremos erradicar. A quem interessa arquivar esse projeto? Quais os argumentos para ser contra e fazer manobras para que um bem a população seja barrado? São muitas perguntas que costuram esse mandato, junto com indignações e mais tantos questionamentos. Mas, para parar a nossa luta é necessário muito mais do que a institucionalização da burocracia, o impedimento dos acessos, muito mais do que os jogos políticos. Porque o nosso trabalho independe de um mandato. E isso esteve também nesta demanda: já que o Estado, na figura do Município, trata com desdém a fome, nós articulamos, junto com a Coalizão Negra por Direitos, a doação de 11 toneladas de alimentos, distribuindo cestas básicas e cestas orgânicas da agricultura familiar.

O nosso trabalho, no entanto, depende muito mais do que “força de vontade”. Aqui, na política coronelista de Uberlândia, se você não entra na roda, você não dança. Não topamos fazer o jogo mesquinho da velha política Nada para nós veio de graça ou caiu do céu. Nosso mandato acredita na estratégia “pé dentro, pé fora”, é um pé na institucionalidade e outro nos movimentos sociais, pé no plenário e pé no barro. Por isso, em cada ato fora Bolsonaro estivemos lá. Fortalecendo a Comissão de Segurança, com panfletos, faixas, ecoando nossa voz.

Mas, como a minha cor marca a minha trajetória de luta, outros projetos que dignificam o povo negro, que representa 42,9% da população de Uberlândia, segundo o Censo de 2010, foram propostos e aprovados. O primeiro deles, Processo 385/2021, institui a “Semana Municipal de Formação e Capacitação sobre a História e Cultura Afro-Brasileira”, para contribuir por uma escola antirracista e por uma educação que conte a história do nosso povo. O segundo, Processo 456/2021, cria a Semana e Dia do Hip Hop na Cidade de Uberlândia, para celebrar a cultura periférica, o ritmo e a poesia da parcela da população que teve suas manifestações culturais negadas durante todo o período histórico, desde a colonização desse país. Aguarda parecer da Câmara, ainda, o Processo 462/2021, que considera bem cultural para fins de tombamento de natureza imaterial a Cultura Hip Hop no Município de Uberlândia.

Outro projeto proposto, com a intenção de reconstruir uma cidade com dignidade e respeito ao povo negro, é o Processo 625/2021, que acrescenta dispositivos a lei nº 5.626, de 13 de agosto de 1992. — Lei de Denominação de Públicos. A inserção é para que espaços públicos (ruas, praças, parques) não recebam nome de pessoas que foram escravocratas e atuante nas práticas escravagistas. Homenagear pessoas que desumanizaram outras, torturaram, sequestraram e violaram direitos e integridade física e mental, não faz parte do nosso perfil enquanto um mandato que preza pela vida e pelo respeito. E que além de prezar, usa de todas as ferramentas dadas ao papel de uma vereadora para inseri-las nas pautas para debater e erguer uma política que sirva aos interesses do povo e não só aos interesses de alguns.

Outros projetos apresentados pelo nosso mandato que aguardam parecer na Câmara Municipal de Uberlândia:

PL 156/2021 (Processo 250/2021) — Dispõe sobre a política do “Wi-Fi Grátis” que disponibiliza o acesso a rede de internet wi-fi em pontos e prédios públicos a comunidade em geral no município de Uberlândia e dá outras providências.

Aguardando parecer

(Processo 464/2021) — Institui o Portal da Transparência de Inventário dos Bens Adquiridos e Recebidos durante a pandemia da Covid-19.

Aguardando parecer

(Processo 471/2021) — Dispõe sobre o direito dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) ao acesso à informação acerca de sua saúde de forma remota digital, acrescenta dispositivos à Lei nº 10.715, de 21 de março de 2011 e dá outras providências.

Aguardando parecer

(Processo 527/2021) — Obriga agências bancárias e instituições congêneres a fornecerem cadeiras de rodas às pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências.

Aguardando parecer

(Processo 528/2021) — Assegura à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, o direito de realizar a comprovação de vida pelas agências bancárias e instituições congêneres em sua própria residência.

Aguardando parecer

(Processo 574/2021) — Dispõe sobre a isenção à doadores de pagar taxa de inscrição para concursos públicos e processos seletivos realizados pela Administração Direta e Indireta do Município de Uberlândia, revoga a Lei nº 13.080, de 11 de abril de 2019 e dá outras providências.

Aguardando parecer

(Processo 623/2021) — Torna obrigatório o uso de máscaras transparentes em todos os estabelecimentos que realizam atendimento ao público.

Aguardando parecer

(Processo 637/2021) — Dispõe sobre a obrigatoriedade de apresentação do comprovante de vacinação contra a covid-19 nos locais que prestam serviços à coletividade e para a obtenção de serviços.

Aguardando parecer

Na corrida final do ano letivo na Câmara, foram aprovadas as Emendas Impositivas para que cada vereadora e vereador destinasse R$ 1.000.000 para ONG’s, sendo que metade desse orçamento, R$ 500.000 devem ser destinados à área da saúde. Votamos contra o projeto quando tramitou na Câmara, por acreditar que isso é um instrumento para a formação de currais eleitorais e um ótimo contribuinte para a manutenção de poderes, cargos e privilégios. Mas, uma vez aprovado, decidimos que, se esse dinheiro advém do povo, o povo que precisa decidir. Assim, elaboramos e tornamos público um Edital para que Instituições pudessem propor projetos que caberiam nesse orçamento e que, através de uma chamada coletiva, fossem selecionados.

Nove projetos foram adicionados as Emendas Impositivas que protocolamos na Câmara Municipal, para que a Prefeitura dê continuidade. Agora, cabe a todas e todos, fiscalizar e monitorar para que a verba seja repassada e assim, os projetos sejam executados.

Paralelo a isso, corria na Câmara a Lei Orçamentária Anual (LOA), a qual apresentamos 5 emendas que acreditamos no poder de auxílio à população. Áreas que precisam estar dentre as prioridades orçamentárias do município e que anseiam por investimentos. Dentre elas, está a Emenda Dignidade Menstrual que inclui na rubrica da Atenção Primária (SECRETÁRIA DA SAÚDE), a disponibilização de absorventes higiênicos como um dos itens que são distribuídos gratuitamente a população; a Emenda Renda Básica que aumenta a previsão orçamentária na rubrica da estruturação da rede e execução de ações socioassistenciais; a Emenda Wi-Fi Grátis que garante uma cidade conectada, digital e tecnológica a toda população e é uma forma de fortalecer a democracia; a Emenda Cestas Pró-Pão que visa aumentar a rubrica do PRÓ-PÃO para que o orçamento dê conta da alta demanda de famílias cadastradas e por último, a Emenda Casa Abrigo LGBTQIA+ que prevê a criação de uma casa abrigo para atender pessoas LGTQIA+ em situação de vulnerabilidade social. Nenhuma de nossas Emendas para a Lei Orçamentária Anual foi acatada pela Casa Legislativa.

Tem muita água pra passar debaixo da ponte

Nossa luta apenas começou, ainda temos muito para fazer e arquitetar uma cidade que dialogue com as causas sociais e com os interesses da população, dando à Classe Trabalhadora, ao povo pobre, a oportunidade de serem protagonistas na cidade que residem e pagam impostos. Impossível demarcar nessas páginas todos os enfrentamentos vividos para que o mínimo seja proposto, vá para as discussões e após um caminho abarrotado de burocracias e brechas, seja executado. Trabalho como vereadora, mas também sou cidadã de Uberlândia. Tenho interesse pelo bem comum e pela liberdade de que todas e todos possam ter acesso à dignidade, ao trabalho, à fartura na mesa, a um sono mais tranquilo, a uma moradia.

Não é um delírio comunista, não é uma “questão ideológica” como argumenta meus opositores, porque se existe o suor do povo envolvido nas engrenagens que fazem dessa cidade uma referência para o Estado de Minas Gerais, é preciso garantir que ao invés de lágrimas, as políticas municipais proporcionem o gozo. Um ônibus bom e barato, segurança para que corpos não sejam alvos, nem ameaças, educação para que as palavras difíceis não sejam artifícios usados para ludibriar a sociedade. É necessário que riquezas e grandezas não estejam acumuladas em pontos geográficos específicos do município, só existe a “periferia”, tomando essa palavra com um tom social e não de localização, porque existem setores e pouquíssimas pessoas que controlam o que precisa ser feito e o que pode ser deixado de lado.

Na maioria das vezes, as urgências do poder político estão viradas de costas para aqueles que saem do São Jorge para trabalhar no Centro, para as mães que trabalham cedo e deixam seus filhos na creche, para a população que é impossibilitada de acompanhar o nosso trabalho e o trabalho do prefeito, porque estão ocupadas demais fazendo as veias dessa cidade pulsarem vida. Por isso, todos os dias quando acordo, honro o povo trabalhador de Uberlândia que me proporcionou ocupar uma cadeira, que nunca tinha se passado pela cabeça na minha infância, para representá-los. E ser a voz de todas e todos que se dedicam dia após dia ao trabalho das vivências, ainda que tenha uma força política que queira nos chamar de sobreviventes.

Mas não somos. Somos, em maioria, integrantes da linha de frente que movimenta avenidas e ruas, comunidades e bairros, comércio e indústria e devolve vida para esse lugar que não vai ser higienizado pelas pautas tesoureiras. Se para eles os cortes soam como fetiches, que comecem então podando todas as arestas que lhes foram dadas pelo privilégio do gênero, da cor, da sexualidade, do sobrenome. Porque para mim, e para a esmagadora maioria do povo que compõe a população dessa cidade, não foi dado nada.

Ano que vem caminhos e saídas nos reservam, e aproveito para dizer que descansem esse fim de ano, aproveitem a família e não se percam na visão de que a Política dá de ombro para vocês. Porque estou aqui, como representante do nosso povo, trabalhando muito para construir um futuro que brota como feijão colocado no algodão. Tímido, frágil, muitas vezes abandonado por aqueles que se movimentam, se movimentam e não mudam nada, além de suas próprias vidas. Eu não, o meu movimento é para buscar água e claridade, ver crescer, se fortalecer até que o futuro seja uma panela cheia que consiga servir a todos, por isso a necessidade da luta, só com ela é possível “pôr mais água no feijão”.

Deixo aqui os meus agradecimentos por todas as pessoas que me abordam, dialogam, requerem, participam, fazem parte do meu mandato. Mesmo com todas as disfuncionalidades que pairam sobre os poderes do Brasil, existe em mim um rompante de que as coisas peguem impulso e andem. Mesmo que para isso seja preciso enfrentar burburinhos, cochichos, insultos, violências que querem me imobilizar, mas quem se parece comigo está em movimento. A caixa do supermercado, o segurança, o garçom, o estudante, a atendente de telemarketing, a professora, o motorista do ônibus, os garis, os catadores de lixo, todas as pessoas dessa cidade que precisam de trabalho para viver.

Portanto, reforço aqui meu compromisso de continuar fazendo um trabalho que me traz tranquilidade ao deitar a cabeça no travesseiro e iniciativa ao tomar a primeira xícara de café. Vocês não estão sozinhos, porque existem muitas vozes bordadas na estrutura desse mandato. Como uma colcha que reúne em retalhos vidas inteiras, culturas, causas, causos, risos, prantos, vontade de que as coisas sejam diferentes, pra ontem. Firmo meus olhos no horizonte, escancaro o meu sorriso porque com ele é menos difícil encarar as caras entroncadas. Os passos miúdos também constroem trajetórias, os pequenos atos também enfeitiçam períodos e nós seremos lembradas como a geração que descontinuou o ciclo repetitivo da “velha política”. Estamos vivos, e se tem vida, tem sonho, e se tem sonho, tem jeito.

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Dandara Tonantzin

Da quebrada para o mundo para virar uma mesa do poder.